Páginas

27 de dez. de 2013

A Juca nossa de cada dia.


Antes de tudo, permita-me dizer que as próximas linhas escritas se fundamentam no olhar, no observar, nunca conversei ou tive qualquer contato direto com Juca, que se foi, mas me deixou lições. 

Foi em meio ao vai e vem da Av. Rio Branco que uma figura humana se tornou ícone, patrimônio desta cidade, ainda que não reconhecida, essa avenida já não é a mesma sem a sua pele negra, sem o lenço na cabeça e suas saias longas e floridas, já não sentiremos o cheiro da fumaça do carvão e nem tão pouco ouviremos os seus palavrões ecoarem pelo ar. Mas de quem estou falando? Interrogai a calçada que lhe acolheu, ao poste que lhe iluminou ou ao quarto que lhe abrigou, ambos serão unânimes em responder: Juca!

Ontem, quando vi na página de um amigo uma das raras fotos dela, em meio a pensamentos concluí que Juca era uma verdadeira cidadã pedreirense que nunca recebeu esse título. A partir disso lhe convido a refletir: O que faz de um pedreirense um cidadão pedreirense? O status ou o serviço? O que faz de Juca um ser especial?

De uma forma genérica, Juca era apenas uma mulher vendendo milho na rua, para muitos insignificante, depravada e digna de pena, mas certa vez observando-a percebi que era bem mais que isso, Juca era autêntica no vestir, no falar e no viver, ela tinha um estilo, o estilo Juca de ser, assumia suas raízes e não precisou usar jeans para dizer que existia, falava palavrões enquanto muitos morrem engasgados em defesa de uma falsa moralidade, ela tinha liberdade, Juca foi verdadeiramente livre, sem amarras e jargões, seu patrão mudava a cada segundo, eram pessoas simples que apenas queriam degustar um bom milho assado, o fogareiro era sua mesa, o abano sua caneta e o céu o teto do seu escritório, ela não procurava motivos para não estar ali, era necessário e ponto.


Juca nos dá uma lição de simplicidade e autenticidade, quando ria é porque estava de fato alegre, sua tristeza tinha seus motivos e se ela te xingou é porque você procurou. E o que dizer de suas opiniões políticas? Ela tinha suas convicções, suas indignações e ao contrário do que costumeiramente fazemos, não se esquivava de falar de política, do seu jeito, com seus adjetivos.

Juntemos todos esses detalhes e poderemos ver quão grandiosa são as lições deixadas por ela, pensar que quantas Jucas e Jucas não temos por aqui, pessoas que fazem o bem e permanecem no anonimato, reconhecidas por poucos, seus diplomas são o sorriso de quem enxerga a beleza de suas ações, esses sim precisam serem reconhecidos, bajulados, não fazem do fazer o bem uma moeda de troca. Juca nunca foi uma líder, nunca foi uma personalidade pedreirense, mas sua conduta deita por terra o caráter daqueles a quem chamamos de lideres e nossos representantes, lobos com pele de cordeiro. Mas o que nos torna cidadãos pedreirenses?

Não deveria ser o sobrenome nem tão pouco nosso poder aquisitivo, cidadão pedreirense é todo aquele que na sua individualidade pensa na coletividade, que respeita suas ruas, esquinas e becos, suas cores e sua gente, que respeita nossos trabalhadores, que respeita seus eleitores e nossas tradições, cidadão pedreirenses é todo aquele que vê no outro uma extensão de si, que vê no rosto do irmão pedreirense a sua própria face. Assim foi Juca, e com sua morte, não me cabe dizer para onde vai, mas de uma coisa sei, a sua presença fará desse lugar um lugar melhor.

Quem conheceu Juca a conheceu de verdade!

Quim Buckland
Fotógrafo e Designer

Nenhum comentário:

Postar um comentário