Foi em meio ao vai e vem da Av. Rio Branco que uma figura humana se tornou ícone, patrimônio desta cidade, ainda que não reconhecida, essa avenida já não é a mesma sem a sua pele negra, sem o lenço na cabeça e suas saias longas e floridas, já não sentiremos o cheiro da fumaça do carvão e nem tão pouco ouviremos os seus palavrões ecoarem pelo ar. Mas de quem estou falando? Interrogai a calçada que lhe acolheu, ao poste que lhe iluminou ou ao quarto que lhe abrigou, ambos serão unânimes em responder: Juca!
Ontem, quando vi na página de um amigo uma das raras fotos dela, em meio a pensamentos concluí que Juca era uma verdadeira cidadã pedreirense que nunca recebeu esse título. A partir disso lhe convido a refletir: O que faz de um pedreirense um cidadão pedreirense? O status ou o serviço? O que faz de Juca um ser especial?
De uma forma genérica, Juca era apenas uma mulher vendendo milho na rua, para muitos insignificante, depravada e digna de pena, mas certa vez observando-a percebi que era bem mais que isso, Juca era autêntica no vestir, no falar e no viver, ela tinha um estilo, o estilo Juca de ser, assumia suas raízes e não precisou usar jeans para dizer que existia, falava palavrões enquanto muitos morrem engasgados em defesa de uma falsa moralidade, ela tinha liberdade, Juca foi verdadeiramente livre, sem amarras e jargões, seu patrão mudava a cada segundo, eram pessoas simples que apenas queriam degustar um bom milho assado, o fogareiro era sua mesa, o abano sua caneta e o céu o teto do seu escritório, ela não procurava motivos para não estar ali, era necessário e ponto.
Juca nos dá uma lição de simplicidade e autenticidade, quando ria é porque estava de fato alegre, sua tristeza tinha seus motivos e se ela te xingou é porque você procurou. E o que dizer de suas opiniões políticas? Ela tinha suas convicções, suas indignações e ao contrário do que costumeiramente fazemos, não se esquivava de falar de política, do seu jeito, com seus adjetivos.
Juntemos todos esses detalhes e poderemos ver quão grandiosa são as lições deixadas por ela, pensar que quantas Jucas e Jucas não temos por aqui, pessoas que fazem o bem e permanecem no anonimato, reconhecidas por poucos, seus diplomas são o sorriso de quem enxerga a beleza de suas ações, esses sim precisam serem reconhecidos, bajulados, não fazem do fazer o bem uma moeda de troca. Juca nunca foi uma líder, nunca foi uma personalidade pedreirense, mas sua conduta deita por terra o caráter daqueles a quem chamamos de lideres e nossos representantes, lobos com pele de cordeiro. Mas o que nos torna cidadãos pedreirenses?
Não deveria ser o sobrenome nem tão pouco nosso poder aquisitivo, cidadão pedreirense é todo aquele que na sua individualidade pensa na coletividade, que respeita suas ruas, esquinas e becos, suas cores e sua gente, que respeita nossos trabalhadores, que respeita seus eleitores e nossas tradições, cidadão pedreirenses é todo aquele que vê no outro uma extensão de si, que vê no rosto do irmão pedreirense a sua própria face. Assim foi Juca, e com sua morte, não me cabe dizer para onde vai, mas de uma coisa sei, a sua presença fará desse lugar um lugar melhor.
Quem conheceu Juca a conheceu de verdade!
Quim Buckland
Fotógrafo e Designer