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3 de dez. de 2013

"Calçadão do Paraíba": A lei é mais importante que o ser humano?



O que é mais importante, a Lei ou o Ser Humano? Que é isso Quim? Decidiu filosofar nessa manhã de terça? Questionar é filosofar, uma grande verdade, mas o angu desta vez é real e bem mais prático, estacionado no movimentado Calçadão do Paraíba, não é esse o nome do lugar, mas é assim popularmente conhecido, então, vamos aos pormenores da questão.

Fiquei surpreso (não fui o único) ao saber que os camelôs teriam que zarpar (sair) do seu local de trabalho, diga-se de passagem, há décadas estão ali e o oficio vem sendo passado de pai para filho, trata-se do comercio informal, gente que encontrou naquele espaço apertado, dignidade, identidade e claro, uma forma de prover renda, contudo, no afã de que a Lei deve ser cumprida (e deve) o Ministério Publico enviou aos mesmos a notificação abaixo, recomendando a saída do lugar, como pode ser visto, a ação se ampara na Constituição.


Nada a discordar, a via é pública, mas aí vem a questão: O que é mais importante, a Lei ou o Ser Humano? Ontem fui ao local e conversei com alguns dos trabalhadores, lá estava Dona Luzia, que trouxe a luz um pouco da história do lugar, desde sua construção durante o governo Josenil, a saber, acessibilidade era coisa do futuro, raras as cidades no Brasil foram planejadas e muitas surgem dessa falta de planejamento, o que dizer das favelas? E as invasões tão comuns por aqui? E os loteamentos? Será que não faltou bom senso ao nosso tão justo Ministério Público? Pelo menos faltou bom senso nas declarações da Dra. Lana, ao descrever a decisão tomada como “irreversível”, durante esclarecimento no Programa Tribuna 101 na FM Cidade de Pedreiras. Nenhuma brechinha sequer? Bastou uma tarde de chuva para prorrogarem o tempo, agora até 31 de Dezembro, período em que a atual gestão terá que apresentar muito mais que papéis e slides bonitos a comissão que representa a classe de trabalhadores, afinal, a campanha já passou.

Não é de hoje que o Óculos de Grau aponta para os nossos problemas de acessibilidade, recentemente mostramos inúmeros obstáculos que tornam a caminhada do pedestre pelas ruas de Pedreiras um verdadeiro Super Mario, contudo, tão histórica quanto a falta de planejamento urbano é a incapacidade das gestões de gestar, com isso temos ruas e praças abarrotadas de placas, cadeiras, mesas, e me mantenho cético para acreditar que as coisas vão mudar, afinal, os que mais transgridem as leis são os que bancam a gestão, o poder e isso é geral... Já no caso Calçadão, a primeira pergunta que deve ser feita é: Porque estão ali? Não se trata apenas do comprar e vender, pensar assim é ignorar o “eu lugar’, existe uma relação profunda de quem ali trabalha com a paisagem, é uma questão cultural e a controvérsia não se resolve com um papel, pivô da polêmica, que poderia ter sido evitada com aquele diálogo tido à tarde entre a promotoria, prefeito, seus assessores e secretários mais a comissão representante dos notificados.


Talvez a promotora não entenda essa afinidade do trabalhador com seu ambiente de trabalho, afinal, seu escritório é apenas um lugar de paredes brancas, com computadores, mesas, gavetas e muito papel, isso não difere dos demais escritórios espalhados pelo mundo, assim é no Shopping Center, num banco, mas quantos Calçadões do Paraíba você conhece por aí? É um lugar único, existindo a relação do ser com o lugar, essa paisagem é tembem afetiva aos pedreirenses e se grande parte da população se manifestou contra essa postura há um motivo e este deve ser considerado, logo, tal não se resume a uma questão puramente econômica ou ambiental. Mas voltando a ao “X” da questão, o que é mais importante, a Lei ou o Ser Humano?

Lembra da velha pergunta sobre o ovo e galinha, apesar de semelhante à questão é mais profunda, que a Lei deve ser cumprida, isso é óbvio, mas a mesma não pode ser feita de maneira indiscriminada, antes de qualquer coisa precisa ser contextualizada, caso contrário, em vez de ordem, a mesma tende a aprofundar as diferenças sociais. Pobre não tem direito aos recursos, as instâncias? A lei não é maior que o ser humano, ainda mais quando em vez de promover dignidade, retira-lhe, digo isso tendo como base o caso aqui comentando, logo, equilíbrio e harmonia são palavras que devem ponderar em situações um tanto peculiares, a regras foram criadas afim de que todos sejam beneficiados, no quesito obstáculo as barracas do Calçadão andam longe de serem os maiores entraves enfrentados pelos pedestres. 

Na letra a Constituição é linda, mas já somos bem grandinhos e sabemos a diferença quando ela parte para a prática e nem mesmo a promotora Lana poderá questionar que quanto maior o poder aquisitivo maior será as brechas escavadas nas letras, justiça boa é aquela que começa de casa.

Quim Buckland
Fotógrafo e Designer

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